SOCIÓLOGOS
AVALIAM PAPEL DAS CIÊNCIAS HUMANAS NO CURRÍCULO ESCOLAR
Em resposta
ao editorial “Lição
errada”, que diz repeito ao aumento da carga horária de filosofia,
sociologia e artes no currículo do ensino médio no Estado de São Paulo, a
Federação Nacional dos Sociólogos (FNS) tem esclarecimentos a fazer.
O editorial
ataca, de forma gratuita e preconceituosa, a sociologia e outras ciências
humanas. Do ponto de vista objetivo, baseado em que pressupostos o texto afirma
que incluir (conforme determinado por lei) ou aumentar as cargas horárias de
sociologia, filosofia ou artes sejam “experimentalismos duvidosos”, e
“matemática e português” sejam disciplinas “estruturantes”?
Para efeitos
de uma formação que privilegie a construção da cidadania e a despeito da atual
formação instrumental, utilitarista e individualista que visa apenas o mercado
e o sucesso individual, acreditamos que sociologia, filosofia ou artes devem
ter primazia ou importância equivalente.
Historicamente,
a educação nunca foi prioridade no Brasil. De um modo geral, o modelo
educacional brasileiro que conhecemos hoje é remanescente do imposto nos anos
1960 pela ditadura militar, em que as ciências humanas gradativamente foram
perdendo espaço na grade curricular do sistema educacional em nível de educação
básica e média, tanto no ensino público quanto no privado.
Mais
recentemente –década de 1990–, as ciências humanas passaram por outras medidas
de caráter restritivo, impostas pelo modelo americano. Influenciados pelas
ideais de uma educação meramente utilitária e tecnicista, os currículos foram
adaptados para assegurar uma formação que privilegiasse as disciplinas
instrumentais, em detrimento de conteúdos voltados para uma formação cidadã e
humanista, incompatíveis, antes, com o regime autoritário e, agora, com o
neoliberal.
No campo da
educação, prevalece o discurso que privilegia o ensino e a pesquisa inter ou
transdisciplinar. Do ponto de vista epistemológico, o sujeito pós-moderno
opõe-se aos grandes modelos teóricos.
A atuação
política pós-moderna desqualifica e dissimula a ação política tradicional
(Estado, partidos políticos, sindicatos, movimentos populares etc.), preferindo
atuar por meio de ações voluntárias de ONGs, bem como, nos atos mais ou menos
espontâneos de grupos e/ou de sujeitos políticos protagonistas ou
representantes de demandas sociais específicas ou de grupos excluídos.
Caracteriza-se
por uma tendência aberta ao individualismo e ao utilitarismo escamoteados por
uma espécie de hedonismo socializado pela mídia. Esvazia os conteúdos
ideológicos intrínsecos ao campo político e reduz o papel do Estado a mero
financiador ou prestador de serviços públicos. Nesse contexto é que se inserem
as interpretações sobre os fatos históricos e os acontecimentos políticos ou
sociais na atualidade.
A
criminalização de setores do movimento social, de um lado, e as recentes –e,
por que não dizer, históricas– respostas violentas às reivindicações sociais e
populares mostram que as alternativas autoritárias ainda resistem e seduzem
setores insatisfeitos com as respostas oferecidas pela política tradicional e
os relativismos estabelecidos pela pós-modernidade.
Não é sem
motivo que nos lugares tradicionais de conflito e competição –trabalho,
política, moral, sexualidade, cultura–, em que inexistem limites definidos ou
claros, é que encontramos a crise instalada nessas sociedades.
As diversas
crises –econômica, étnica, político-ideológica, entre outras– que encerraram o
século 20 e inauguram o 21 demonstram de modo incontestável o esgotamento dos
modelos liberais ocidentais, a despeito dos sofismas neoliberais reacionários.
É nessse
contexto que o aumento da carga horária de filosofia, sociologia e artes no
Estado de São Paulo se insere e reflete a urgência de se pensar uma sociedade
mais humana e cidadã onde os jovens, integrantes do ensino médio, serão os
protagonistas desse novo modelo.
Ricardo
Antunes de Abreu é presidente da Federação Nacional dos Sociólogos (FNS)
e Mario Miranda Antonio Junior é sociólogo e consultor da FNS